Sous-vide: riscos, benefícios e regulações

Por Autor Convidado em 23/01/2019

Os consumidores têm cada vez mais procurado alimentos preparados e embalados minimamente processados. Isto se deve, em parte, às percepções e preocupações dos consumidores com o uso de produtos químicos e seu risco à saúde. As pessoas também têm tido estilos de vida mais ativos, além de haver cada vez menos pais que ficam em casa, o que também aumenta a demanda por alimentos que podem ser fácil e rapidamente preparados. Produtos sous-vide (a vapor) são minimamente processados e fáceis de ser preparados. Entretanto, existem alguns riscos à saúde e em termos de segurança que precisam ser abordados para fabricar esses produtos com segurança e comercializá-los.

Produtos comercialmente preparados com a técnica sous-vide estão sujeitos a combinações de tempo/temperatura que propiciam letalidade a células vegetais e possíveis bactérias formadoras de esporos. O cozimento tradicional por sous-vide, porém, normalmente utiliza um tratamento por calor moderado que abarca apenas células vegetais e conserva o máximo da qualidade do produto. Após o cozimento, os produtos sous-vide são resfriados, armazenados a frio, sendo que sua vida útil pode passar de 42 dias, e então são reaquecidos antes de consumidos.

 

Riscos

Os principais riscos associados a produtos alimentícios sous-vide são historicamente considerados como patógenos anaeróbicos, psicrotróficos, incluindo Bacillus cereusClostridium botulinumnão proteolítica. Registrou-se que 28% das geladeiras dos consumidores estão a uma temperatura acima de 4,4°C. Além disso, temperaturas de prateleiras de exposição para venda também demonstraram alcançar temperaturas de 7,61°C a 9,8°C (LAGUERRE, HOANG, ALVAREZ & FLICK). Estas informações sugerem que quando se afere o risco em produtos sous-vide, linhagens proteolíticas de Clostridium botulinumtambém devem ser levadas em conta.

Os processos comerciais de sous-vide podem variar desde a focalização de uma redução 3D de Salmonella, objetivando uma vida útil curta de menos de cinco dias, passando por uma redução de 6D de Listeria spp. ou redução de 7D de Salmonella, até a obtenção de uma redução de 6D de Cl. botulinumproteolítica. Os produtos sous-vide também devem receber um cuidado especial em relação à formação de patógenos com esporos, já que estes produtos alimentícios são lacrados a vácuo e o processo térmico diminui ou elimina a microflora competitiva. Esses produtos podem não incluir técnicas convencionais de conservação de controle do pH, diminuição da atividade aquosa e formulação com concentrações de sal a níveis elevados suficientes para controlar ou retardar o crescimento de micro-organismos, já que pode haver um impacto negativo nas características sensoriais dos produtos finais.

 

Estratégias de mitigação de riscos durante a formulação e fabricação

Assim como acontece com todos os alimentos comercialmente produzidos, o embasamento para a mitigação de riscos deve utilizar critérios científicos de segurança alimentar com base no sistema de Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle (HACCP, na sigla em inglês). Deve-se dar atenção especial aos ingredientes. A avaliação dos ingredientes deve incluir uma análise detalhada das matérias-primas associadas a recalls/surtos relacionados ao patógeno em questão. A qualidade das matérias-primas é um dos fatores mais influentes para garantir segurança durante a vida útil dos produtos sous-vide. A obtenção de fontes de fornecedores com boa reputação, que sejam certificados pela Iniciativa Global de Segurança de Alimentos ou que possuam cerificações de terceiros, pode ajudar a garantir que a qualidade da matéria-prima seja consistente. Uma medida adicional que pode ser utilizada para mitigar riscos é a incorporação de ingredientes tratados para a redução patogênica, como no caso de temperos, quando possível, na formulação.

Quanto à formulação do produto, o uso de controles de pH, a atividade aquosa e o percentual de sal podem ser utilizados para acrescentar barreiras inibitórias aos alimentos. Outra opção extremamente eficaz é incluir na formulação do produto agentes antibotulínicos. Dependendo do tipo do alimento, o uso pode ser limitado devido à coloração rosada da carne sob baixas concentrações de nitrito de sódio. As percepções dos consumidores também podem limitar seu uso, porém, os consumidores podem estar mais abertos a formas naturais de agentes antibotulínicos, tais como aipo cultivado.

 

Mitigação de riscos durante a distribuição

A mitigação de riscos durante a distribuição em função do controle de temperatura é crucial para auxiliar na diminuição do risco de um problema de segurança alimentar. Temperaturas de refrigeração de 3,2°Csão necessárias para garantir que o crescimento não proteolítico de Cl. botulinumseja controlado. Em estudos publicados, a temperatura por si só foi responsável por 75% de variabilidade em toxigênese. Outra importante ponderação é que, com o aumento de temperatura, o tempo entre a deterioração e a formação de toxinas diminui, o que demonstra a capacidade de a toxina estar presente quando o alimento aparentar estar aceitável para consumo. Opções para ajudar a mitigar os riscos dependem da situação e podem incluir o uso de dispositivos de monitoramento da temperatura, antimicrobianos, resfriamento profundo ou distribuição de congelamento, além de limitação da distribuição direta para comercialização.

 

Benefícios

Os resultados da técnica sous-vide em um produto premiumsão notáveis em um produto no qual os consumidores tendem a pagar um preço maior. A qualidade do produto é mantida, maus odores da oxidação são inibidos e perda evaporativa de sabor é evitada (BALDWIN, 2011). Pelo fato de se utilizar temperaturas precisas, o produto final é mais consistente em comparação a técnicas convencionais de cozimento. E de uma perspectiva de segurança alimentar, a selagem a vácuo evita o risco de recontaminação do alimento na fase de fabricação.

 

Recomendações

Os itens a seguir são recomendações para que alimentos sous-vide sejam fabricados e comercializados com segurança:

1) Os produtos são fabricados de acordo com um Plano de Segurança Alimentar preestabelecido (HACCP);

2) Deterioração detectável e rejeição pelo consumidor precedem a possibilidade de produção de toxinas;

3) Faça uso de matérias-primas de alta qualidade;

4) Armazene os alimentos a uma temperatura de 3,3°C ou abaixo disto;

5) Os produtos devem ser classificados quanto a requisitos de armazenamento, temperatura, vida útil e cozimento;

6) Promova prioridades de pesquisa que facilitarão o desenvolvimento racional e uso seguro de alimentos sous-vide.

 

Por Buffy Montgomery, Ph.D., microbiologista-chefe, ConAgra Brands

Referências

BALDWIN, D. E. “Sous vide cooking: A Review” (tradução livre:“Cozimento por sous-vide: uma análise”). International Journal of Gastronomy and Food Science, vol.1,nº 1, p. 15-30, 2011.

HYYTIA-TREES, E.; SKYTTA, E.; MOKKILA, M.; KINNUNEN, A.; LINDSTROM, M.; LAHTEENMAKI, L., …; & KORKEALA, H.  “Safety evaluation of sous vide-processed products with respect to nonproteolytic Clostridium botulinumby use of challenge studies and predictive microbiological models” (tradução livre:“Avaliação de segurança de produtos processados por sous-vide em relação a Clostridium botulinum não proteolítica por meio do uso de estudos comparativos e modelos microbiológicos preditivos”). Applied and Environmental Microbiology,vol.66, nº 1, p. 223-229, 2000.

MCINTYRE, L.; JORGENSON, V. & RITOSN, M. “Sous vide style cooking practices linked to SalmonellaEnteritidis illnesses” (tradução livre:“Práticas de cozimento de estilo sous-vide relacionadas com doenças causadas por Salmonella enteritidis”. Environmental Health Review, vol.60, nº 2, p. 42-49, Disponível em: <https://doi.org/10.5864/d2017-014>, 2017.

National Advisory Committee on Microbiological Criteria for Foods (tradução livre:Comitê Consultivo Nacional sobre Critérios Microbiológicos para Alimentos). “Parameters for determining inoculated pack/challenge study protocols” (tradução livre:“Parâmetros para a determinação de protocolos de investigação comparativos de embalagens inoculadas”). Journal of Food Protection, vol. 73, nº 1, p. 140-202, 2010.

Porch.Com. “Cooking nightmares.  A generational look at capabilities in the kitchen” (tradução livre:“Pesadelos do cozimento: uma análise geracional das capacidades na cozinha”). Recuperado de: <https://porch.com/resource/cooking-nightmares>, 2018.

ZINK, D. L. “The Impact of Consumer Demands and Trends on Food Processing” (tradução livre:“Impacto das demandas do consumidor e tendências de processamento de alimentos”). Emerging Infectious Diseases, vol. 3, nº 4, p. 467-469. Disponível em:  <https://dx.doi.org/10.3201/eid0304.970408>, 1997.

 

Fonte: CarneTec Brasil

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