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Polícia Civil abre inquérito para investigar presidente da Aprosoja-MT

Em Mato Grosso soja é a principal cultura de verão, ocupando nesta safra 9,46 milhões de hectares. (Foto: Editora Globo)

 

Segundo representação feita ao Ministério Público do Estado, Antônio Galvan teria incitado o plantio de soja semente fora do período recomendado

 

A Polícia Judiciária Civil de Mato Grosso (PJC-MT) instaurou um inquérito para investigar a conduta do presidente da Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja-MT), Antônio Galvan, por suposta incitação ao descumprimento da Instrução Normativa 002/2015, do Instituto de Defesa Agropecuária de Mato Grosso (Indea-MT).

O documento estabelece o calendário de plantio da soja, de 16 de setembro a 31 de dezembro, seguido do período de vazio sanitário, até 15 de junho. Em Mato Grosso soja é a principal cultura de verão, ocupando nesta safra 9,46 milhões de hectares, vindo em seguida o algodão com 158,9 mil hectares. Após a colheita do oleaginosa os produtores semeiam a chamada “segunda safra”, que neste ano terá 4,74 milhões de hectares de milho e 913,5 mil hectares de algodão.

A Aprosoja-MT, segundo representação feita ao Ministério Público do Estado (MP-MT) pelo Indea em dezembro de 2018, divulgou uma recomendação por escrito, assinada por Galvan, aos associados para que não mais fizessem seus plantios para produção de sementes próprias em dezembro e, sim, a partir de 1º de fevereiro. Além disso, ele também teria feito diversas declarações públicas, por meio da imprensa, defendendo maior liberdade para o produtor decidir qual a época ideal para iniciar o plantio.

A normativa do Indea leva em conta a necessidade de prevenção e controle da ferrugem asiática, a perda de eficiência e a redução da disponibilidade de fungicidas (ingredientes ativos) para controle da doença, além das condições de solo e clima de Mato Grosso. As medidas visam eliminar as plantas de soja após a colheita e assim romper o ciclo e reduzir a quantidade de esporos (célula com condições ambientais favoráveis à germinação dos fungos) presentes no ambiente.

A ferrugem asiática da soja, que foi identificada pela primeira vez no Brasil em 2001, provoca a desfolha precoce da planta e impede a completa formação dos grãos, o que gera redução na produtividade. Segundo o Consórcio Antiferrugem, coordenado pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), a ferrugem é considerada a principal doença da cultura da soja e possui um custo médio de US$ 2,8 bilhões.

Conforme explicam os advogados de Galvan, cuja defesa foi feita após pedidos de esclarecimentos do órgão MP/MT, a mudança de dezembro para fevereiro se justificaria em razão do último mês de cada ser um período de chuvoso, de “molhamento foliar maior”, ideal para que a ferrugem se desenvolva.

A explicação é que as plantas crescem mais, as linhas de plantio se fecham, há uma maior nebulosidade e a junção desses fatores faz com que a curva de progresso da doença seja muito acentuada, tornando os controles menos eficientes, curativos e, em consequência, a enfermidade fica mais agressiva. Isso implicaria no uso de 10 ou mais aplicações de fungicidas e elevaria os custos dos produtores.

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A ferrugem asiática da soja, que foi identificada pela primeira vez no Brasil em 2001, é considerada a principal doença da cultura. (Foto: Divulgação)

Segundo a defesa, há consensos de pesquisadores demonstrando a viabilidade de plantação em meses outros que não os impostos pela Instrução Normativa. “Isso, sem prejuízo ao meio ambiente nem à coletividade. Daí se indagar se se qualifica como juridicamente adequada a citada IN que, a despeito disso, estrangula a liberdade de iniciativa dos produtores rurais para, sem fundada razão, impor-lhes obrigações que se tornaram excessivas”, diz outro trecho.

Ainda de acordo com a defesa de Galvan, a maioria dos produtores mato-grossenses teria se manifestado favorável à alteração da data da janela de plantio, de dezembro para fevereiro.

Entre as recomendações feita pelo presidente por escrito aos associados, segundo documentos anexados pelo Indea à representação, estão: que a área de produção fosse limitada a no máximo 5% do total e não deveria ocorrer na sequência de soja sobre soja; que fosse vedada a comercialização conforme legislação pertinente; que o plantio estaria autorizado em fevereiro e que o Indea-MT deveria ser avisado; que a colheita deveria ocorrer antes do início do período de vazio sanitário, ou seja, 15/06;  que não houvesse semeadura de soja no mês de janeiro; entre outros pontos.

Histórico

No dia 19 de dezembro de 2018, a então presidente do Indea-MT, Daniella Soares de Almeida Bueno, protocolou uma representação em desfavor do presidente da Aprosoja-MT, sob o argumento de incitação ao descumprimento de medidas fitossanitárias para prevenção e controle da ferrugem asiática da soja.

No decorrer da apuração dos fatos, o promotor de Justiça Joelson de Campos Maciel, da 16ª Promotoria de Justiça de Defesa do Meio Ambiente Natural de Cuiabá, ouviu representantes do Indea-MT e da Aprosoja-MT, que teriam concordado sobre a necessidade de mais estudos e discussões em torno do calendário de plantio de soja em Mato Grosso.

Por esse motivo, no dia 18 de fevereiro, o Ministério Público arquivou o caso. “Não cabe ao Ministério Público intervir e restringir a opinião de uma entidade privada; cabendo, tão somente, atuar como órgão de fiscalização dos cumprimentos das normas legais e tomar as medidas cabíveis”, conforme parecer assinado pelo promotor Maciel.

O Sindicato dos Fiscais Estaduais de Defesa Agropecuária e Florestal (Sinfa-MT), por meio de seu presidente Antônio Rodrigues, não concordou com o encaminhamento dado e solicitou formalmente que fosse dado prosseguimento à apuração. “O presidente da Aprosoja/MT, quando vem a público defender mudança, coloca em cheque todo o trabalho que foi feito pelos servidores do Indea, que são sempre respaldados por estudos técnicos. Não trabalhamos com suposições”, defende o sindicalista.

O Sinfa-MT também anexou à solicitação documentos e vídeos de entidades que já se manifestaram contrárias ao cultivo extemporâneo de soja em Mato Grosso, como a Associação Brasileira do Agronegócio (Abag-BR), a Fundação Mato Grosso e o Comitê de Ação à Resistência a Fungicidas (Frac-Brasil).

Com a nova solicitação, o Ministério Público decidiu remeter a investigação à Polícia Civil. “Devido a juntada de novos documentos, que trazem em seu bojo indício da ocorrência de ilícitos penais, mormente de crimes contra a paz pública, determino encaminhamento de cópia dos autos à Delegacia Especializada do Meio Ambiente”, decide a Promotoria em outro trecho.

A delegada responsável pela Dema-MT, Alessandra Saturnino, informou, por meio da assessoria de imprensa, que o inquérito para apurar o caso foi instaurado e que as primeiras diligências estão em curso.

A assessoria de imprensa do presidente da Aprosoja, Antônio Galvan, informou que ele não irá se pronunciar até a conclusão do inquérito.

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