A companhia de açúcar e etanol São Martinho está investindo para ter a possibilidade de produzir no ano que vem somente etanol anidro em suas unidades de São Paulo, além do açúcar, na tentativa de driblar as adversidades no mercado do biocombustível hidratado, disse nesta quinta-feira o CFO da empresa, Felipe Vicchiato.
Segundo a companhia, o mix de produção vai depender das condições de mercado, embora o momento favoreça o anidro, que é misturado em proporção de 27% na gasolina. Após sucessivas quedas de preço nos últimos meses, a gasolina está mais competitiva do que o etanol na maior parte do país.
“A gente está fazendo um investimento para, basicamente, ter a possibilidade de fazer 100% de anidro nas usinas de São Paulo, então as usinas de São Paulo seriam açúcar e anidro”, disse o executivo durante evento promovido pelo BTG Pactual.
Para ele, desta forma seria possível diminuir “um pouco (o impacto da) volatilidade de preço do etanol hidratado”.
“O mix de produção entre anidro e hidratado dependerá das condições de mercado e preço”, esclareceu a São Martinho à Reuters.
De acordo com Vicchiato, é pequeno o aporte para que as usinas paulistas passem a fabricar apenas anidro, o que permite que a empresa realize o investimento já para o próximo ano. Ele não detalhou o valor que está sendo aplicado na operação.
A São Martinho possui três usinas em São Paulo e uma em Goiás.
O sócio-diretor da Job Economia, Julio Borges, afirmou à Reuters que não é comum que grandes grupos do setor tenham usinas com produção 100% anidro. No caso da São Martinho, ele avalia que pode fazer sentido do ponto de vista operacional, mas não mercadológico.
“Por razões de mercado não faz muito sentido. Por razões de otimização operacional do grupo pode fazer sentido. O veículo flex e o etanol hidratado para uso industrial não vão acabar”, disse ele.
Açúcar
Com relação ao açúcar, Vicchiato disse que o setor sucroenergético tem conseguido prêmios 30% superiores com a venda do adoçante ao invés de etanol, uma vez que o preço do biocombustível caiu na esteira de queda das cotações do petróleo e das reduções tributárias.
Também durante o evento, ele afirmou que a tendência é de preços globais favoráveis ao açúcar, puxados pela política do governo indiano, que pretende elevar a mistura de etanol na gasolina até 2025. “Quando olhamos o prêmio, o setor consegue 30% a mais na venda de açúcar”, disse o executivo.
“Essa agenda da Índia, em misturar o etanol à gasolina, deve fazer com que os preços do açúcar fiquem em patamar bastante remunerador para o setor. O açúcar está em um vento a favor e está bem remunerador para o mercado brasileiro”, acrescentou.
Segundo o executivo de uma das maiores companhias do setor no país, o mercado físico do adoçante no Brasil está “bastante apertado”, em decorrência do recuo na produtividade dos canaviais causado por uma seca que atingiu as lavouras nos últimos dois anos –o que também influencia os preços.
Rafael Abud, CEO da FS, empresa mais focada na produção de etanol de milho, lembrou que a safra 2022/23 começou “bem mais alcooleira”. Mas no decorrer dos meses as usinas do setor foram alterando a destinação da matéria-prima para incrementar a produção de açúcar.
“Ao longo do tempo o etanol foi perdendo competitividade”, disse ele também durante o evento.
Para o diretor da São Martinho, a queda nos preços do etanol teve dois grandes fatores: a mudança na tributação de combustíveis e o recuo nas cotações externas do petróleo.
Ele lembrou que a Petrobras promoveu cortes nos preços da gasolina nas refinarias que pressionaram os valores do etanol, mas dos 25% de queda nos preços do biocombustível, a influência da gasolina responderia por 13% a 14%, “e o restante é questão tributária”, disse.
“Agora o setor vai ter que enfrentar isso”, ressaltou Vicchiato sobre o cenário de preços do etanol.
No caso da São Martinho, segundo o executivo, a estratégia para lidar com as adversidades no mercado do biocombustível é reduzir seus custos com melhora na produtividade da cana.
Atualmente, as produtividades da companhia estão em patamares considerados baixos pelo CFO, em torno de 70 toneladas por hectare, mas a expectativa é de recuperação.
“No momento em que a gente renovar para a média, que a gente consegue chegar em torno de 80 a 85 toneladas por hectare, a gente consegue reduzir bastante esse meu custo unitário e ser mais competitivo”, disse.
Ele ainda pontuou que nas últimas semanas houve um volume elevado de chuvas nas regiões produtoras, fator muito importante neste momento para o desenvolvimento dos canaviais.
Além disso, se depois destas chuvas vier um verão em padrões climáticos normais, a cana-de-açúcar tende a ganhar peso e tamanho na próxima temporada.
Por Nayara Figueiredo
Com reportagem adicional de Roberto Samora
Fonte: Reuters