Estudos com feromônio do psilídeo mostram que o comportamento do inseto é alterado quando ele é infectado pela bactéria Candidatus Liberibacter (CLas), causadora do greening. Isso faz com que seja muito difícil produzir um produto comercial à base do feromônio do inseto para uso no campo.
Haroldo Volpe, pesquisador do Fundecitrus, explica que a demanda para estudar o feromônio do psilídeo surgiu em 2015. “O feromônio sexual é um atrativo produzido pela fêmea da espécie, e que promove alterações comportamentais em indivíduos machos da mesma espécie. Fomos então procurar o feromônio sexual do psilídeo, se ele realmente existia e, existindo, qual molécula causa a atratividade do macho”, explica o pesquisador.
O objetivo do estudo era encontrar um atrativo para colocar na armadilha adesiva amarela, ou seja, aliar atração física (cor da armadilha) com a atração química (feromônio). Tal necessidade se mostrou importante quando, na época, muitas vezes o número de insetos capturados nas armadilhas não condizia com o aumento de árvores contaminadas com a bactéria. “Essa armadilha já promove uma atratividade, ela é amarela e chama a atenção do inseto, queríamos então aditivar o feromônio, potencializar essa armadilha, já que muita gente se queixava que o greening no pomar estava aumentando, mas a captura de psilídeo crescia de maneira muito branda”, pontua Volpe.
Os estudos eram feitos com psilídeos que não estavam contaminados com a CLas, criados em condições controladas e em grande quantidade para pesquisas diversas com o inseto vetor do greening. “Era bem mais fácil de criar o inseto sem a bactéria, naquele momento nem cogitávamos a ideia de trabalhar com o inseto contaminado, nosso objetivo era encontrar o composto que a fêmea utilizava para atrair o macho”, comenta Volpe.
O composto encontrado na pesquisa foi o ácido acético. Com ele em mãos, era preciso entender qual era a quantidade necessária da substância para atrair o psilídeo macho. O teste utilizado para esse objetivo é a olfatometria. Após entenderem a dose ideal para a atração do inseto, era o momento de entender como se daria a produção do feromônio no campo, utilizando formulação industrial. Nesse momento, uma parceria com uma empresa foi firmada para que, posteriormente, a produção começasse.
Com a fórmula em mãos, Haroldo e outros pesquisadores foram para a Califórnia. Lá se juntaram a Walter Leal, um dos principais especialistas no mundo em ecologia química e olfato de inseto e que liderou o projeto desde a etapa inicial. “Foi um período muito importante ao lado do Walter, conseguimos encontrar uma formulação que atraía mais insetos machos para a armadilha quando comparado a armadilhas que não contavam com essa formulação. Naquele momento achávamos que tínhamos um produto que de fato atrairia os psilídeos, estávamos muito próximos de um produto comercial”, relembra Haroldo.
Walter Leal afirma que o estudo trouxe diversos desafios. O primeiro deles era descobrir se realmente existia um feromônio. “Não sabíamos se esse inseto produzia um feromônio sexual, por isso fizemos um estudo de comportamento detalhado para chegar à conclusão de que realmente as fêmeas produzem o feromônio que atrai os machos. Essa foi uma etapa muito difícil e crucial de ser concluída”, pontua.
A complexidade do assunto também se pronunciava devido à falta de material científico sobre o tema na época. “Não se sabia nada sobre isso. Nesse sentido, o Fundecitrus não só colaborou com ideias novas para o manejo do inseto vetor do greening, mas também contribui com a ciência mundial, ou seja, descobrindo que o macho, uma vez infectado, está com o sistema olfativo afetado, de forma que ele requer uma quantidade bem maior do feromônio para obter o mesmo efeito”, salienta Leal, antes de reforçar a dificuldade de se realizar estudos com o psilídeo: “Tudo é difícil nesse inseto, posso dizer que com mais de quarenta anos trabalhando com feromônio, esse foi o inseto mais complicado de todos”.
Após ter a fórmula em mãos, os pesquisadores voltaram para o Brasil para testá-la. A expectativa era de que a formulação obtivesse êxito e atraísse o psilídeo macho para as armadilhas. O resultado dos testes, no entanto, foi diferente. “Fizemos testes com essa formulação em pomar orgânico, mas ele não causava a mesma atratividade. Analisamos aproximadamente 20 formulações e aqui no Brasil não obtivemos boas respostas. Ele até atraia o inseto, mas de maneira muito tímida”.
Os estudos, então, se concentravam em entender o motivo da formulação funcionar nos Estados Unidos, mas não no Brasil. Alguns fatores foram cogitados, como uma diferença de proporção entre insetos machos e fêmeas entre os dois países. Embora existisse uma diferença, foi concluído que não era esse o fator que impedia uma maior atratividade do psilídeo.
Foi então que os pesquisadores começaram a olhar para uma outra diferença entre os insetos presentes nos dois países. “Na época não havia tantos insetos contaminados na Califórnia como aqui no Brasil, foi aí que começamos a cogitar a possibilidade de a doença afetar o comportamento do macho em relação à formulação que havíamos desenvolvido”, explica Volpe.
A pesquisa seguiu para comprovar ou não as suspeitas dos pesquisadores. Haroldo relembra que nesse momento começaram a criar insetos contaminados para que esse comportamento fosse confirmado ou não. “Pegamos a concentração do feromônio homologado em olfatômetro e que atraía insetos não contaminados, e percebemos que essa concentração não atraía os insetos contaminados. Começamos então a aumentar a concentração no olfatômetro, e entendemos que para atrair o inseto contaminado precisávamos de uma concentração cinquenta vezes maior. Vimos então que esse projeto perdeu viés comercial, já que em várias regiões nós temos mais de 60% dos insetos já contaminados com a bactéria e, em outras, nós temos uma porcentagem muito abaixo disso. Não há como produzir formulações para atrair insetos contaminados e não contaminados ao mesmo tempo. Se você fizer baixa, vai atrair somente insetos não infectados, se for uma concentração alta, somente os infectados. Isso deixa a produção desse produto inviável”, conclui o pesquisador.
Além de evidenciar que no momento é impossível uma produção industrial do feromônio, os estudos corroboram com outros trabalhos que mostram a diferença de comportamento do psilídeo contaminado com a bactéria do greening. “Nós vimos com nossos próprios estudos algo que a literatura já estava relatando, que de fato há mudanças comportamentais no inseto infectado com a bactéria. O inseto com e sem a bactéria respondem de maneiras diferentes.
Além da mudança de comportamento com relação aos feromônios, outros estudos já demonstraram que o psilídeo infectado pela bactéria Candidatus Liberibacter tem outras alterações no comportamento, como: aumento no número de ovos; maior taxa de reprodução; mais voos de dispersão e voos com intervalo de tempos menores.
Fonte: Fundecitrus