A aplicação dessa tecnologia para a conservação dos alimentos foi apresentada durante o Seminário sobre Irradiação de Alimentos
Empresas que atuam com equipamentos para a irradiação de alimentos apontam que frutas e produtos cárneos são os itens do agro que, a princípio, mais interessam aos investidores. A discussão surgiu na tarde desta quarta-feira (15), durante o último dia do Seminário sobre Irradiação de Alimentos, promovido pela Sociedade Brasileira de Proteção Radiológica (SBPR), com apoio do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).
Em todo o mundo, as frutas têm sido irradiadas com segurança em larga escala. Em média, elas duram três vezes mais depois da exposição a essa forma de energia. Proteínas foram incluídas na lista de interesse em função de uma sazonalidade menor e da boa aceitação do produto irradiado em outros países.
De acordo com os debatedores, 186 centros de irradiação estão implantados em 47 países e o consumo de alimentos irradiados é permitido em 60 países. O Brasil trabalha no desenvolvimento de uma política de Estado para adotar a irradiação de alimentos, processo que amplia a durabilidade de forma segura, reduzindo o desperdício e expandindo o mercado exportador.
Durante o seminário, empresários participaram de uma rodada de negócios moderada por Luís Eduardo Rangel, do Mapa. Ruan Souza, representante da estatal russa Rosatom, disse que os produtos cárneos teriam capacidade maior para viabilizar um projeto de irradiação. “Frigoríficos brasileiros têm três ou quatro grandes mercados de exportação. Precisamos entender a aceitação no mercado externo, porque no mercado interno ainda é necessário trabalhar a opinião pública”, explicou.
Juliano Campos Nogueira, diretor comercial da Nuctech do Brasil, também destacou que o Brasil ainda não tem a cultura de irradiação de alimentos, por isso defendeu a instalação de um irradiador multipropósito, que pudesse atender a área médica e o agro, reduzindo custos operacionais. “O Brasil precisa quantificar as perdas. Quanto o produtor perde por não irradiar as frutas, por exemplo? A irradiação iria ampliar as exportações? Sabemos que a China consome frutas irradiadas”, explicou.
Gerardo Meave Flores, da Efoods Imports no México, concorda. Segundo ele, o Brasil tem potencial para instalar de cinco a sete plantas de irradiação de alimentos para o consumo nacional e exportação. “O agro brasileiro tem muitos produtos que podem se beneficiar. Os países que compram querem sanidade”, disse Flores. O processo de irradiação favorece a segurança dos alimentos.
Mauro Ferreira, do Grupo IBA, também vê com entusiasmo o mercado de irradiação de alimentos no Brasil. “As indústrias vão competir, vão querer se instalar aqui. O agro é a estrela do país e um incentivo do governo, numa janela de tempo, poderia dar o start nesse processo”, avaliou, citando a necessidade de envolver universidades nessa etapa inicial.
Segurança
O Seminário de Irradiação de Alimentos durou dois dias e atraiu mais de mil inscritos em ambiente virtual. Durante a programação, especialistas na tecnologia explicaram conceitos básicos e falaram das possibilidades de aplicação da técnica. Jaqueline Calábria, da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), explicou que o processo é muito criterioso e bastante controlado. “Os alimentos não ficam radioativos, assim como os pacientes submetidos à radiação não ficam radioativos. A aplicação no agro não tem capacidade de modificar a estrutura nuclear”, afirmou. Segundo ela, além de aumentar a vida útil, a irradiação permite a eliminação de pragas.
O pesquisador da Embrapa Agroindústria de Alimentos, Murillo Freire, apresentou resultados de pesquisas em produtos vegetais, como mangas, água de coco, suco de laranja, agrião e beterraba minimamente processados, entre outros. “A irradiação é um método de conservação de alimentos que deve ser utilizado em conjunto com outras boas práticas agrícolas, sempre pensando em manter as características sensoriais dos produtos”, falou.
Na abertura do evento, o secretário executivo do Mapa, Marcos Montes Cordeiro, reforçou a necessidade de se quebrar tabus em relação à irradiação. “A desmistificação deve ocorrer não só no Brasil, mas no mundo todo, e estamos trabalhando nesse sentido. O poder público poderá oferecer os instrumentos necessários à iniciativa privada, que já manifestou interesse no assunto”, disse ele.
O diretor titular de Agronegócio da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Roberto Ignacio Betancourt, afirmou esperar que o evento estimule o avanço da irradiação de alimentos no Brasil. “Estamos ficando para trás. Precisamos dessa importante ferramenta para diversificar nossa pauta de exportações, incluindo produtos de alto valor agregado”, explicou.
O contra-almirante Carlos André Coronha Macedo, secretário de Coordenação de Sistemas do Gabinete da Segurança Institucional da Presidência da República, disse que a segurança alimentar é uma política de Estado no Brasil, que vai reduzir o desperdício e permitir o acesso a mercados internacionais. “É um imenso potencial tecnológico que vai fortalecer o Programa Nuclear Brasileiro”, disse.
Experiências Internacionais
Durante o Seminário, também foram apresentadas experiências internacionais do uso da irradiação em alimentos. Daniel Perticaro, presidente da Alati (Associação Latinoamericana de Tecnologia de Irradiação) falou do potencial do uso da tecnologia na América Latina e Caribe, onde 630 milhões de consumidores podem se beneficiar da irradiação de alimentos.
Gerardo Flores, do México, mostrou que naquele país os supermercados e consumidores já entenderam que se trata de uma tecnologia limpa, que traz benefícios para a alimentação. Segundo ele, é fundamental que se construam alianças estratégicas para a primeira instalação de irradiador em escala comercial, inclusive com o envolvimento dos governos locais.
Miguel Zambada, vice-presidente de Operações da Gateway America em Hidalgo, no Texas, abordou os benefícios e aceitação da irradiação em alimentos nos Estados Unidos. A empresa está instalada em um aeroporto, o que facilita a logística. Mais uma vez, as articulações institucionais foram citadas como mecanismo de sucesso das operações.
A palestra da Radiation Advisory Services, ligada ao governo da Nova Zelândia, foi apresentada por Gustavo Varca, da E-Beam. Ele mostrou um panorama sobre o comércio internacional de produtos frescos tratados por radiação, com foco na Austrália, Nova Zelândia e Ásia. Também frisou que acordos bilaterais entre países que desejam comercializar produtos irradiados precisam ser muito bem definidos, prevendo padrões, riscos e procedimentos.
Comunicação
Várias palestras apontaram a comunicação com o consumidor como um dos grandes problemas para o uso da tecnologia no Brasil. A diretora da Comunicação da SBPR, Denise Levy, apresentou uma pesquisa que a sociedade realiza desde 2017, entrevistando consumidores para captar suas percepções a respeito de alimentos irradiados. Os dados indicam que, após uma breve explicação sobre a tecnologia, eventual rejeição de consumidores se dissipa.
A superintendente federal de Agricultura de São Paulo, Andréa Moura, mostrou as ações do governo federal em relação ao estímulo para a adoção da tecnologia, o comprometimento do Mapa com o tema e as ações de comunicação já desenvolvidas. Entrevistas da alta cúpula do ministério e um plano de comunicação que prevê eventos e uso de redes sociais estão em andamento.
Participaram da mesa de abertura do seminário, além de autoridades já citadas, Josilto de Oliveira Aquino, presidente da SBPR; Edna Morais Oliveira, representando a Embrapa; Paulo Roberto Pertusi, presidente da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) e Anna Lucia Villavicencio, presidente do Seminário sobre Irradiação de Alimentos, que leva o título “Tecnologia e inovação na mesa dos brasileiros”.
Fonte: MAPA