Este cereal super presente na alimentação nacional é pesquisado pelo Instituto Agronômico há 89 anos, ininterruptamente.
Por Carla Gomes (MTb 28156) – Assessora de imprensa IAC
O milho é um cereal muito presente na alimentação brasileira – milho pipoca, milho verde, milho canjica branco e amarelo – cozido, refogado, no cachorro-quente ou em grãos como é vendido nas praias. É um alimento popular e carrega curiosidades interessantes. Por exemplo: cada “cabelo” da espiga fertilizado pelo pólen forma um grão de milho. Aquele “cabelo” presente na espiga, que para crianças do interior representam uma “boneca de milho”, origina um grão que irá compor as receitas nacionais. Em 24 de maio comemora-se o Dia Nacional do Milho. E a gente entende bem porque esse grão merece um dia só para ele. A manutenção desse item na culinária envolve muita ciência agronômica, como a conduzida pelo Instituto Agronômico (IAC), da Secretaria de Agricultura e Abastecimento de São Paulo. O IAC gera e transfere tecnologias para pequenos e médios produtores por meio de cultivares e híbridos de milho caracterizados por qualidade e preço de sementes compatível com o mercado, além de variações do grão em composição, cor e formato.
“A coloração do ‘cabelo’ apresenta diferentes tonalidades, variando de amarelo claro até alaranjado, dependendo da quantidade de antocianina, que pode ser classificada como ausência de cor, presença fraca, média e forte de antocianina”, explica a pesquisadora do IAC, Maria Elisa Ayres Guidetti Zagatto Paterniani.
A cientista explica que os milhos doce e verde não devem ter sabugos nem cabelos pigmentados, pois os materiais coloridos em conservas podem depreciar o produto e o consumidor pode pensar que é cabelo humano. “O milho verde cozido para barraquinhas também não pode ter cor, pois a água de cozimento pode ficar escura e levar o consumidor a rejeitar o produto”, comenta.
Segundo a pesquisadora, o milho é uma espécie que apresenta cerca de 95% de fecundação cruzada, isto é, o pólen de uma planta vai para outra. A polinização natural, em geral, é efetuada pelo vento e por abelhas.
“Durante a polinização, as abelhas depositam grãos de pólen nas bonecas, onde germina o tubo polínico, a fertilização, e vai até o ovário da planta, onde ocorre a fecundação, formando o embrião e o grão de milho”, explica. Trinta dias após a polinização – processo em que o grão de pólen é levado de uma planta a outra – já tem o milho verde e, após 60 dias, faz-se a colheita do milho grão.
Na fase de embonecamento, aquela em que é possível ver as “bonecas de milho” nas lavouras, a ocorrência de estresses, principalmente a seca, pode comprometer drasticamente a produção de milho, principalmente o número de grãos por espiga. “Esta fase ocorre quando os “cabelos” da espiga ficam visíveis, fora da palha; um grão de pólen atinge um cabelo e tem-se polinização. Então ocorre a fertilização, que leva cerca de 24h para crescer em direção ao óvulo, onde ocorre a fecundação e a formação do grão de milho”, descreve a pesquisadora.
A dispersão do pólen ocorre até 14 dias, sendo o mais comum entre o 5° e 8° dia. Ele é liberado pela manhã, até as 12h, e pode ser carregado por até 500 metros de distância, com viabilidade de uso durante cerca de 24 horas, em condições ideais. “A fertilização ocorre entre 12 e 36h após a polinização”, diz Maria Elisa.
A polinização manual é feita para obtenção de linhagens, via auto-fecundação, e híbridos de milho, via cruzamentos. A técnica é destinada também à manutenção da viabilidade de sementes, ou seja, manter o poder de germinação em câmara fria. Este trabalho também é fundamental para a preservação de Bancos de Germoplasma de milho. Maria Elisa e Sawazaki são curadores desta coleção de plantas no IAC, e fazem polinizações manuais, todos os anos, para manutenção do Banco e produção de híbridos experimentais.
Na polinização manual, são intercruzadas plantas de milho antigas, mais recentes e, principalmente, gerações avançadas de híbridos comerciais de milho convencionais, isto é, não transgênicos. “Esses híbridos convencionais não existem mais no mercado, o que torna essa coleção importantíssima, pois são fontes de genes para resistência a doenças, tolerância a estresses ambientais e outros caracteres agronômicos importantes, considerando-se que foram submetidos a intenso processo de seleção e melhoramento”, explica a pesquisadora, que conta com o auxílio de seus alunos do curso de Pós-Graduação IAC em Agricultura Tropical e Subtropical.
Nichos de mercado são atendidos pela pesquisa paulista
O Instituto Agronômico (IAC) disponibiliza cultivares de milho convencionais, isto é, não transgênicas, para cultivo de milho verde, milho pipoca e milho canjica branco e amarelo. Estes produtos compõem o mercado de milhos especiais que abastecem o consumo interno. Essas demandas específicas relativas ao mercado de milho não seriam atendidas se não houvesse o trabalho do IAC e de outras instituições públicas de pesquisa que estudam esses tipos de milho.
O IAC orienta sua programação científica de acordo com as necessidades e a realidade do mercado. Nunca foi propósito do Instituto público de ciência agronômica concorrer com o mercado de sementes das empresas multinacionais. Estas fornecem sementes transgênicas para os grandes produtores e indústrias, para quem o milho é considerado commodity.
Entre as cultivares de milhos especiais desenvolvidas pela equipe do IAC destacam-se os híbridos de milho pipoca IAC 125 de alta produção de sementes e menor custo destas. O IAC 367 tem alta capacidade de expansão da pipoca – isto é – não sobram grãos sem estourar. O IAC 98 destaca-se pela alta produtividade. “Para se obter maior rendimento de pipoca estourada, é importante que os grãos estejam perfeitos, sem trincas, danos mecânicos, ataque de pragas e fungos, e com o teor de umidade em torno de 13,5 a 14%”, conta o pesquisador Eduardo Sawazaki, que coordena o Programa de melhoramento de milho pipoca há 40 anos no IAC.
Para o mercado de canjica amarela, destaca-se o híbrido IAC 3330, que tem grãos duros de cor laranja forte, coloração que indica maior teor de caroteno, precursor da vitamina A. O IAC 3330, além de alto rendimento de canjica, tem maior teor de óleo nos grãos, característica que favorece a indústria, onde o óleo de milho é um subproduto de alto valor. O consumo de alimentos fortificados como a canjica, pipoca e canjiquinha de milho com alto teor de caroteno, beneficia a saúde humana.
O milho verde é um produto altamente perecível. Por isso, em seu melhoramento genético devem ser buscadas janelas de colheita mais amplas e maior tempo de prateleira. Para o consumidor, as características desejáveis neste produto são: sabor adocicado dos grãos, que também devem ser amarelos e bem empalhados, envoltos em casca fina e com facilidade para soltar os “cabelos” da espiga. Para maior conservação das espigas de milho verde, é importante a refrigeração a 7°C e uso de embalagens herméticas. Todos os híbridos de milho desenvolvidos pelo IAC estão disponíveis para as empresas privadas produtoras de sementes interessadas em fazer produção em parceria ou licenciá-los.
Programa de melhoramento de milho IAC
O programa de melhoramento de milho do IAC busca desenvolver cultivares com alta produtividade, resistência a pragas e doenças e elevada sanidade de espigas. Esses materiais convencionais, isto é, não transgênicos, são direcionados ao mercado de média tecnologia para atender pequenos e médios produtores que atuam em nichos de mercado. “Trabalhamos para oferecer novos tipos de híbridos intervarietais e cultivares de milhos especiais para a alimentação humana”, diz Maria Elisa, que coordena o trabalho juntamente com os pesquisadores do IAC, Sawazaki e Aildson Pereira Duarte. As pesquisas contam também com a participação de pesquisadores da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA).
Os híbridos intervarietais, que começaram a ser pesquisados no IAC em 2000, têm baixo custo, menor preço de sementes, são mais produtivos e atendem, principalmente, às demandas de São Paulo e Mato Grosso do Sul. Em 2019, o IAC lançou o híbrido IAC 8053, destinado à produção de grãos para consumo humano e também para ração animal. Este novo material alia produtividade com alta qualidade das espigas para o milho verde. Também pode ser utilizado para produção de silagem e grãos. “O IAC 8053 vai nas receitas de sucos, bolos, pães, pamonhas e doces em geral”, diz a pesquisadora, que se assume apaixonada por milho desde menina. Maria Elisa atua no desenvolvimento de híbridos intervarietais de milho, em especial no melhoramento deste cereal com tolerância à seca. “Considerando o cenário mundial de escassez de água, tenho pesquisado e obtido materiais resistentes à seca bastante promissores”, diz a pesquisadora.
O híbrido intervarietal foi desenvolvido pelo IAC para atender aos produtores rurais que enfrentavam problemas com baixa produtividade no milharal. Assim, precisavam de sementes de qualidade, porém com preços acessíveis. Segundo Maria Elisa, o custo de produção de sementes dos híbridos é reduzido porque são eliminadas as etapas de obtenção e multiplicação de linhagens – um processo caro e demorado que deve ser realizado todos os anos.
Os primeiros intervarietais, IAC 8333 e IAC 8390, apresentam características de elevada produtividade. Mais recentemente, foram lançados os intervarietais IAC 8046 e IAC 8077, que são híbridos de milho convencional, com potencial produtivo de nove a dez toneladas, por hectare. O IAC 8077 apresenta produtividade acima da média dos resultados obtidos no Brasil: com apenas 20 quilos de sementes é possível colher um hectare de milho.
Em 1932, no IAC, foi implantado o primeiro programa de melhoramento de milho híbrido no Brasil, que contribuiu para revolucionar o modo de cultivar, colher e consumir o milho brasileiro. Com pesquisas ininterruptas nessa área, em 2022 o IAC irá completar 90 anos dedicados ao milho.
Por Bruno Amato
Fonte: Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo