Soja: mercado internacional aquecido e mercado interno em demanda torna o cultivo atraente tanto em áreas tradicionais quanto em novas áreas

Uma das principais commodities brasileiras, a soja ganhou mais destaque e espaço nas áreas paulistas nos últimos tempos devido ao alto preço pago pelos mercados internacionais e nacionais. Com cultivo e manejo semelhante ao do feijão, a soja foi a cultura escolhida na reforma de pastagens, em rotação com cana-de açúcar, milho, enfim, várias outras alternativas que dependem da região e da escolha ou oportunidades que se apresentem ao produtor.

No Estado de São Paulo, a principal região produtora é Itapeva com cerca de 210 mil hectares de cultivo e, em 2020, produção de mais de 14 milhões de sacas de 60 kg. Desses 210 mil hectares, 83 mil estão no município de Itapeva, que ultrapassou Assis, tradicional região produtora no Estado de São Paulo que, no mesmo período, contou com cerca de 8,1 milhões de sacas de 60 kg em área aproximada de 160 mil hectares. Mas isso não foi de uma hora para outra, conta o engenheiro agrônomo Vandir Daniel da Silva, da Coordenadoria de Desenvolvimento Rural Sustentável (CDRS) Regional Itapeva que vem acompanhando todo o processo, do final dos anos 1990 até hoje.

“Eu fiz várias capacitações em Plantio Direto na Palha (PDP) em diferentes estados e épocas porque meu intuito era promover a recuperação das pastagens degradadas da região. A ideia era implantar o PDP introduzindo a soja sobre a pastagem degradada. Em 1996/1997 só tínhamos três produtores de soja, mas conforme fomos intensificando a rotação, os pecuaristas, tanto de corte quanto de leite, viram que a soja dava um retorno econômico maior que o boi e que o leite e passaram primeiro a diversificar a produção e depois a apostar, em especial, na soja. Para se ter uma ideia da expansão, há 25 anos Itapeva tinha 90 mil hectares de pastagens, sendo 80% degradada; hoje são apenas 25 mil hectares de pasto e de três mil hectares de soja, saltamos para 83 mil hectares de plantio”, conta Vandir.

Os produtores de soja de Itapeva vão do mini, ao pequeno, médio e grandes produtores, em torno de 500 propriedades que cultivam soja. O grão tornou-se o carro-chefe da região, ocupou áreas de pastagens, de reflorestamento, em especial de eucalipto e, também, áreas de cana-de-açúcar, que, de oito mil hectares foi reduzida para 2,5 mil ha, com tendência a zerar. “Entre os fatores que contribuíram para a expansão estão o clima e o solo, trata-se de uma região de transição, no qual o clima não é afetado pelo La Nina, nem pelo El Niño, a altitude acima de 750m até mais de mil metros também favorece, propiciando um clima quente durante o dia e ameno durante a noite. Por isso, além da maior produção, também temos a maior produtividade com 90 a 100 sacas/ha, enquanto a média do Estado é de 50 sacas/ha. Há solos melhores, mas a junção destes fatores é muito benéfica à soja”, ressalta Vandir.

E no rastro da expansão da soja, vieram as cooperativas. No início só havia a Cooperativa Agroindustrial Holambra; hoje mais três se instalaram na região: Capal, Castrolanda e, no ano passado, a Cocamar abriu três unidades na região, nos municípios de Itapeva, Buri e Itaberá.

Porém, a tradicional região de Assis no cultivo da soja não deixa a desejar e os municípios que se destacam na região são Maracaí, Palmital e Cândido Mota, maiores responsáveis pela colheita de mais de oito milhões de sacas de 60 kg de soja no ano de 2020, segundo dados do Instituto de Economia Agrícola (IEA). O que vem garantindo bons preços ao produtor é estarem amparados por grandes cooperativas, caso da Coopedrinhas, de Pedrinhas Paulista, da Coopermota, de Cândido Mota e, ainda, pela paranaense Cocamar, com sede em Maringá (PR). “A soja pode ser colhida e armazenada para ser comercializada com melhores preços, de acordo com a variação do mercado. No ano passado, a saca de 60kg começou o ano sendo comercializada em torno de R$ 75,00, chegou a R$ 160,00 ainda em 2020, e hoje está próxima de R$ 170,00”, explica o engenheiro agrônomo Cristiano Geller, da Casa da Agricultura de Maracaí, vinculada à CDRS Regional Assis.

As cooperativas garantem um bom custo de produção pelo fato da compra conjunta de insumos e por dispor da infraestrutura necessária ao armazenamento. Isso faz com que produtores pequenos e médios também possam investir no cultivo da soja na região por se sentirem amparados pelas cooperativas. Na região de Assis, a maioria dos produtores cultiva em áreas médias de 60ha a 70ha, mas pequenos produtores, com áreas de 10ha também cultivam. “Antes era inviável aos pequenos, mas o preço alcançado no mercado vem compensando e o mercado é grande, tanto interno, na fabricação de ração, em especial, e também de exportação, em especial para a China”, adianta  Cristiano Geller.

“A soja vem migrando para as áreas de pastagens e também de cana-de-açúcar, sendo cultivadas em rotação. Grandes empresas da região estão investindo na compra de maquinários para plantar soja, antes os produtores de cana-de-açúcar, que utilizam em cerca de 70 mil a 80 mil hectares, costumavam cultivar amendoim na rotação de culturas (período de outubro a março); mas hoje estão investindo em soja. “Produtores de Echaporã e Quintana procuravam áreas de rotação para plantar amendoim na região de Assis, porém hoje estas áreas estão sendo destinadas ao cultivo de soja. Embora tenha havido migração nas áreas procuradas para cultivo, a área total se manteve praticamente a mesma, passando de 158 mil hectares para 163 mil hectares”, argumenta Cristiano Geller.

As pastagens degradadas também são um convite ao plantio de soja em rotação. A soja na rotação melhora o solo e, em consequência a pastagem. Geralmente o pecuarista não é um agricultor, porém estas parcerias são benéficas a ambos, seja no lado financeiro, seja no ganho ambiental. É o que vem acontecendo na região de Araçatuba e o que incentivou, já há tempos, o cultivo de soja nas regiões de Ourinhos, Presidente Venceslau, Presidente Prudente e, mais recentemente, de Itapeva. “A diversificação de culturas, por exemplo, com olericultura e fruticultura em nossa região seria muito interessante para pequenos produtores se não estivéssemos tão distantes dos maiores mercados consumidores, o que temos de hortifrutigranjeiros é suficiente para suprir as demandas locais. Dessa forma, a soja, aliada ao fato da grande demanda e também por poder ser armazenada à espera de bons preços, tornou-se uma ótima opção ao lado da cana-de-açúcar, do milho e das pastagens para os produtores desta região”, explica Cristiano Geller.

Segundo o técnico, a soja precisa de uma mescla de sol e chuva, sendo o ideal quando faz sol durante o dia e chove à noite. O cultivo ocorre do meio para o final de setembro até o início de outubro e, durante a fase de florescimento, o ideal é que a temperatura não ultrapasse 34°C, com 38°C já acontecem os abortamentos das flores que, consequentemente, irão influir na colheita maior ou menor. Chuvas intensas também não são bem vindas e esta é a preocupação dos produtores nesta última fase de colheita, iniciada em meados de fevereiro e que finalizará até o final do mês de março. “Além de causar erosões, toda a colheita pode ser perdida em função de chuvas intensas”, explica o técnico. É o que vem ocorrendo em Mato Grosso onde se espera que haja queda de 30% na produção nesta safra 2021. Com a colheita ainda por fechar não é possível estimar a produção de soja para esta safra 2021.

No Vale do Paraíba, importante bacia leiteira do Estado de São Paulo e região também conhecida pelo cultivo de arroz em áreas alagadas, a soja, de 2015 para cá também está presente em cada vez mais propriedades. Tal fato é devido a um trabalho dos extensionistas da CDRS Regional Guaratinguetá, que procuravam alternativas agrícolas e econômicas viáveis que pudessem manter na atividade os produtores da região.

 “A soja floresce em função do número de horas de luz, isto é um fato e nós tínhamos estas condições, porém o Vale não tinha zoneamento climático para a soja, e precisávamos, como fator de desenvolvimento rural da região, buscar alternativas. Consideramos que não existem mais áreas para cultivo do arroz na região e, ultimamente, os arrozeiros vêm tendo problemas com a cigarrinha do arroz, e ainda não há uma solução definitiva, embora a pesquisa da Secretaria de Agricultura venha fazendo experimentos para resolver esta questão com plantios mais precoces”, conta o engenheiro agrônomo Vinícius Nascimento da CDRS Regional Guaratinguetá.

Vinícius argumenta que, entre os fatores favoráveis, foi levado em conta a questão da proximidade com o Porto de Santos, de forma a reduzir do custo a questão do frete, cerca de 8% de redução, já que a soja costuma vir de áreas mais distantes. Paralelamente, passaram a levantar as variedades de soja adaptadas à região para que pudessem ser cultivadas na rotação com áreas de pastagens, geralmente degradadas, utilizadas pela pecuária de corte. “Estes estudos começaram a ser feitos ainda em 2013 em parceria entre a Cooperativa dos Produtores de Arroz do Vale do Paraíba (Coopavalpa) e a CDRS Regional Guaratinguetá. Verificamos as datas de plantio e colheita, o manejo do solo, a população de plantas e, em 2015, apresentamos o manejo da cultura para os produtores. Iniciamos com seis produtores interessados e hoje são já são 10 os produtores de soja da região”, conta Vinicius Nascimento.

Vinicius, entusiasmado, relata: “no primeiro ano a produtividade foi de 52 a 56 sacos de 60kg de soja por hectare; no segundo ano, já foi superior a 65 sacos, bem próximo de regiões mais tradicionais de cultivo. Em dois anos, uma lavoura, que era considerada ‘de cupins’, virou um solo agrícola de grande valor e isso vem mudando o cenário agropecuário da região. Houve um salto de modernização; hoje este produtores prevêem a pulverização com uso de drone, utilizam máquinas agrícolas de precisão, cenário de financiamentos é outro. Fomos de 1.400ha para 3.000ha de soja em dois anos  e o planejamento é chegar em 2025 com 15 mil hectares cultivados no Vale do Paraíba, sendo 100% exportados, ¾ deste montante apenas para a China”.

Porém, não é só o mercado de exportação que foi considerado nesta proposta feita aos produtores. “O mercado interno é gigante e há, por parte dos produtores, a intenção de montar uma fábrica de farelos para atender a demanda da própria região. Hoje temos 10 produtores, mas o conhecimento adquirido será passado a outros interessados. Foi um desafio inserir o pequeno e o médio produtor neste mercado, mas estamos atingindo o objetivo. E todos os dias eu me sinto gratificado por estar realizando este trabalho de extensão rural que é promover o desenvolvimento sustentável de uma região”, frisa Vinícius Nascimento.

Um dos produtores de soja é Amauri Gadiolli, do município de Roseira. “O que me levou a reduzir a área de cultivo do arroz, a qual me dediquei durante anos e veio do conhecimento de gerações, dos meus pais e avós todos da Colônia Italiana, foi, mais recentemente, a falta de retorno no investimento, as dívidas em banco, a redução na área de plantio, enfim as dificuldades enfrentadas com a atividade que passaram a ter um custo alto”, relembra o produtor.

“Em 2018, com apoio do Vinicius Nascimento, da CDRS, comecei a cultivar soja. Hoje, em minha área total, dedico nove partes à soja em rotação com milho e em apenas uma parte permaneço com o cultivo de arroz. Nestes últimos três anos, temos recebido todo apoio do técnico Vinícius, um profissional excelente, dedicado a todos os agricultores, isso me incentivou a aceitar a proposta e investir em soja. Além disso, o arroz é uma planta perene, com um plantio só durante o ano; já com a soja é possível fazer rotação de soja com milho e ainda dedicar um plantio à produção de silagem, então em dois anos é possível fazer cinco safras. O mercado tanto de soja quanto de milho é muito bom, o de soja um mercado internacional, e não só eu, mas todos que acreditaram no potencial e resolveram investir no plantio de soja no Vale do Paraíba estão satisfeitos com o resultado”, comenta Gadiolli.

Para Vinícius Nascimento, ser pioneiro implica em desafios, mas ser produtor rural já é um constante desafio. “É preciso estar atento ao mercado, às tecnologias, à pesquisa, ao conhecimento e é isso o que a extensão rural faz: insere os produtores em novas alternativas e propostas para o campo evitando, assim, o preocupante êxodo rural”, comenta o extensionista.

Por Paloma Minke

Fonte: Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo

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