Enquanto as vendas de etanol no mercado interno desabaram em 2020 por causa do cumprimento, ainda que longe do necessário, das medidas de isolamento para evitar a propagação do coronavírus, as exportações decolaram. No crescimento, o Brasil redistribuiu os destinos dos embarques e, com isso, reduziu sua dependência dos Estados Unidos, que historicamente é o principal destino do produto brasileiro.
Nos últimos cinco anos, os EUA representaram entre 50% e 60% do volume de etanol que o Brasil vendeu ao mercado externo. No ano passado, porém, essa fatia caiu para 36%, de acordo com dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex), compilados pelo Ministério da Agricultura.
A Coreia do Sul, por exemplo, que há anos é o segundo maior destino do etanol brasileiro, elevou suas importações em 84% no ano passado. O país – que utiliza o produto apenas para fins industriais, e não como combustível – adquiriu um volume bem próximo do importado pelos americanos, alcançando uma participação de 35% nas exportações brasileiras. Os EUA foram o destino de 984 milhões de litros de etanol do Brasil, e a Coreia do Sul, de 963 milhões de litros.
Outros mercados também aumentaram as importações do etanol brasileiro. Em 2020, o volume de etanol do Brasil que chegou aos portos dos Países Baixos – que servem de porta de entrada das importações feitas pela Europa – quadruplicou em relação a 2019, totalizando 273 milhões de litros. Reino Unido e Turquia também aumentaram as compras do combustível brasileiro 22 e 220 vezes, para 58 milhões de litros e 54 milhões de litros, respectivamente.
O número de destinos também cresceu. No ano passado, 37 países importaram mais de 1 milhão de litros de etanol brasileiro, quase o dobro dos 19 países de 2019.
Alguns desses mercados reapareceram entre os principais destinos do etanol brasileiro depois de muito tempo fora da rota das exportações nacionais. Foram o caso de China e Arábia Saudita, para onde o Brasil embarcou 15 milhões e 11,6 milhões de litros de etanol, respectivamente. A Venezuela, que importou 6,9 milhões de litros, foi um destino inédito.
Para Lígia Heise, analista da consultoria StoneX, o aumento da capilaridade do etanol brasileiro em 2020 reflete principalmente a desvalorização do real, que tornou o produto mais competitivo do que o dos Estados Unidos, líderes globais em exportações. “Como o câmbio saiu de patamares de R$ 4 para R$ 5,50, nossa competitividade ficou maior”, afirmou.
Os embarques americanos perderam força em 2020. No acumulado em 12 meses até outubro, as vendas de etanol dos EUA ao exterior estavam 9% abaixo do patamar de um ano antes. Brasil, Canadá, Filipinas, Peru e Reino Unido, entre outros, reduziram suas importações.
Além disso, surgiu outro mercado para o etanol brasileiro: o de álcool para produzir itens sanitários utilizados na prevenção ao coronavírus. “A relevância do álcool sanitizante para a balança é menor, mas cresceu”, diz a analista.
No ano passado, o Brasil ocupou ainda uma parte do espaço que o Paquistão deixou no mercado – o excedente exportável paquistanês encolheu depois de uma quebra na sua safra de cana do país. No caso do aumento das vendas à Coreia do Sul, o etanol brasileiro encontrou algumas janelas em meio a problemas de certificação enfrentados pelo produto americano.
Para 2021, a perspectiva ainda não está clara, mas não deve ser tão favorável aos embarques brasileiros como foi em 2020, acredita Heise. Ela observou que, neste ano, com a expectativa de quebra de safra de cana, de crescimento da demanda e de mix ainda açucareiro nas usinas, a oferta do combustível no mercado doméstico deve ficar mais apertada. Co isso, haverá menos “gordura” para ser exportada.
“A questão cambial tende a ser mais favorável ao Brasil, mas nosso mercado tem muitas variáveis – e os elementos sugerem que nosso produto será um pouco menos competitivo”, disse.
Fonte: Valor Econômico
Texto extraído do boletim SCA