Atingindo em cheio pela crise, o RenovaBio é alvo de diferentes movimentos que podem provocar uma revisão de suas regras, justamente no ano que deveria marcar a inauguração do programa, com início da comercialização dos créditos de carbono (CBios) na bolsa brasileira.
Parlamentares lidados às frentes do agronegócio e dos biocombustíveis, articulam novos projetos para reformar o programa (e o mercado), enquanto pressionam por uma tributação que reduza barreiras à comercialização de CBios.
Hoje, há dois caminhos para a criação de uma tributação especial para os créditos. Um deles é derrubar o veto de Bolsonaro na promulgação da Lei do Agro. O tema chegou a entrar na pauta desta quarta (17), mas os trabalhos no Congresso Nacional se voltaram à discussão sobre o calendário eleitoral.
A segunda alternativa é a medida provisória, prometida pelo ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque. O texto aguarda uma posição da Receita Federal, justamente o órgão que indicou o veto à inclusão da alíquota de 15% para os emissores de CBios (os produtores de biocombustíveis).
A EPBR apurou que diferentes setores do Ministério da Economia são favoráveis à tributação especial dos CBios e vem se manifestando internamente neste sentido. Mas, por se tratar de regra tributária e, especialmente para vacinar a MP de questionamentos futuros, o assunto só deve andar com aval da Receita Federal.
A proposta que chegou ao Ministério da Economia inclui mecanismos para reduzir barreiras na compra dos créditos, que vão além do que foi incluindo pelos parlamentares na MP 879 – convertida na Lei do Agro (a alíquota de 15%) – e busca delinear como será feita a cobrança para não haver conflitos com a legislação de PIS/Cofins e CSLL. O trabalho conjunto envolve os ministérios de Minas e Energia e da Agricultura.
Quanto ao veto, a visão do governo é que a MP pode ser apresentada mesmo se o Congresso Nacional decidir reverter a decisão de Bolsonaro, funcionando como uma espécie de texto regulamentador da tributação dos CBios.
Esta semana, o presidente da frente parlamentar do setor sucroenergético, deputado Arnaldo Jardim (Cidadania-SP), começou a formalizar pedidos de apoio na Câmara dos Deputados para a derrubada do veto.
“Mantido o veto, deveras, coloca-se um manto de insegurança jurídica sobre os destinos do CBio”, afirma Jardim em documento enviado aos seus colegas na Câmara. A proposta para derrubar o veto tem apoio da Frente Parlamentar Agropecuária (FPA), que reúne mais de 200 dos 513 deputados federais.
Inclusão de produtores
Em outra frente, a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) e mais sete entidades do agro assinaram um manifesto de apoio à inclusão dos fornecedores de matéria-prima, no programa RenovaBio. Há um projeto sobre o tema em tramitação na Câmara dos Deputados, protocolado pelo líder do DEM, Efraim Filho (PB).
Funcionaria assim: o produtor independente teria direito à receita da comercialização dos CBios, na proporção da matéria prima no valor final do biocombustível – conta que precisaria ser regulamentada.
Para o emissor de CBio, o projeto prevê o abatimento dos custos de emissão dos créditos nesse valor a ser pago aos produtores. Quem não pagar, por sua vez, ficaria impedido de emitir CBios até quitar a dívida.
“A estrutura de produção de biocombustíveis tem, como matéria-prima, para a geração de energia ou a fabricação de combustíveis, produtos de origem animal ou vegetal o que denota a grande importância do produtor rural na cadeia produtiva de biocombustíveis, sendo de suma importância que este produtor possa participar ativamente da RenovaBio”, defende o manifesto.
O texto encabeçado pela CNA é assinado por associações de produtores de soja, milho, cana-de-açúcar e óleo de palma.
Para a União Brasileira do Biodiesel e Bioquerosene (Ubrabio), entretanto, tal medida coloca em risco a implementação do programa.
“Se uma medida gerando obrigação de divisão proporcional dos valores dos CBios, como esse projeto quer fazer, for aprovada, ninguém vai querer emitir CBios fora do default no biodiesel. Vão matar o programa no biodiesel”, afirma o presidente da associação, Juan Diego Ferréz.
Revisão das metas
De acordo com o presidente da Ubrabio, ainda paira sobre o programa a redução da metas compulsórias das distribuidoras, anunciada pelo Ministério de Minas e Energia (MME), e a dúvida que paira sobre o modelo de tributação dos CBios.
Sobre as metas, a proposta é de corte de 50%, de 29 milhões para 14,5 milhões créditos, relativos a um período remanescente de 2019, quando o programa não estava completamente implementado, e 2020.
“Há uma pressão do setor de distribuição para reduzir as metas do ano 2020, o que reduziria o valor do CBio. Essa redução prevista pelo MME de 50% nas metas é abusiva”, acredita Ferrés.
Para representantes do etanol, mesmo com a revisão, o preço se manteria equilibrado, sendo resultante da oferta e demanda de CBios e da negociação entre as partes.
“A revisão das metas vai adequar a oferta de CBio ao volume de etanol que deve ser comercializado até dezembro de 2020, com ajustes também para 2021”, defende o diretor técnico da Unica, Antônio de Pádua Rodrigues.
Na visão de distribuidoras representadas pela Brasilcom – em geral, empresas de menor porte, com atuação regional –, a crise tornou inviável cumprir com a compra compulsória, em certa pelo mesmo motivo que preocupam os produtores de biocombustível, a incerteza quanto à tributação.
A visão foi manifestada diretamente ao governo, quando foi feito um pedido de revisão das metas em maio. A associação entende que o cenário de preços do CBios ainda é muito incerto, não sendo possível calcular o impacto nas contas das empresas.
Por Gustavo Gaudarde
Fonte: EPBR